O ganho que traz o trabalho voluntário

12 de agosto de 2012 | 8h17

Claudio Marques


Gabriela Vieira ESPECIAL PARA O ESTADO
 
Campanhas, doações e mutirões de ajuda pontuais já fazem parte de práticas sociais nas empresas. Mas, para a coordenadora do Núcleo de Estudos e Negócios em Desenvolvimento de Pessoas da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Adriana Gomes, as organizações agora caminham para a valorização cada vez maior do trabalho voluntário dos funcionários. Muitas já possuem programas de voluntariado corporativo e expandem as iniciativas para nível internacional. Durante um período de suas férias ou por um tempo cedido pela empresa, o colaborador faz uma espécie de intercâmbio profissional, juntamente com colegas de outros países. No entanto, em vez de ficar no escritório, ele se dedica a atividades sociais. Já ter sido voluntário no seu próprio país é, quase sempre, pré-requisito para a participação nesses programas. “Esse tipo de trabalho precisa ter continuidade. Eu já participava dos programas internos de voluntariado”, conta o analista de processos contábeis Anízio Dias, da ArcelorMittal Brasil. Durante as férias do último ano, ele viajou para a Bósnia-Herzegovina no programa de voluntariado internacional da corporação. Lá, participou da reintegração dos grupos religiosos e sociais do país, através da aproximação das crianças e jovens. “O trabalho que desenvolvemos foi de reintegração da população, muito marcada pelas guerras separatistas. Em conjunto com uma ONG, organizávamos desde a limpeza do local até o cuidado com as crianças e adolescentes, que tinham entre oito e 15 anos”, conta Dias. “De forma alguma você perde suas férias. Na verdade, só há ganho, tanto pessoal quanto profissional”, comenta Jefferson de Matos, consultor da área de pré-vendas e projetos especiais da Telefônica. Ele foi voluntário em El Salvador, dando aulas de reforço e informática para crianças e jovens carentes. “Foi uma experiência inesquecível”, afirma Matos. “Nós demos aulas de informática, inglês, reforço de matemática e de como montar um plano de carreira para crianças e jovens de três a 16 anos. Para os professores, demos capacitação para uso do laboratório de informática montado durante o nosso programa. O reconhecimento, ainda lá, foi enorme. É um pequeno trabalho para nós, mas para eles faz muita diferença”, acrescenta Matos. Depois da viagem, ele passou a fazer parte do comitê de voluntariado da empresa. Exemplo. Além da satisfação pessoal e da experiência internacional, a participação também resulta em ganhos profissionais. “Você acaba se tornando um exemplo e, quando volta, agrega sua experiência e as habilidades desenvolvidas à sua equipe de trabalho”, conta a diretora de vendas para hardware da IBM América Latina, Claudia Valente (fot0). Ela passou três semanas na Polônia desenvolvendo projeto para a competitividade na cidade de Katowice. “A experiência foi incrível.” Os voluntários destacam algumas habilidades mais desenvolvidas com as viagens: melhora na comunicação, relacionamento interpessoal e mais facilidade no trabalho em equipe e com prazos curtos. Também são positivos o aperfeiçoamento da língua estrangeira e o contato pessoal com colegas de diferentes sedes. “A vivência prática de situações inesperadas favorecem importantes competências comportamentais para o profissional e para a empresa, entre elas a criatividade e a capacidade de improvisação”, indica a especialista da ESPM. Dias e Matos acreditam que, mesmo quando o trabalho social não está diretamente relacionado à atividade corporativa, o crescimento profissional é um resultado natural da experiência, porque a pessoa sente o retorno constantemente. Para os funcionários que desejam dedicar seu tempo ao mesmo tipo de programa, os três voluntários dão as dicas. “Eu dediquei de quatro a seis horas por dia, durante os três meses que antecederam a viagem, a pesquisas sobre o país. Lá, a expectativa das pessoas é enorme, e você tem a responsabilidade de representar a empresa, não tem tempo a perder”, conta Claudia, Matos destaca a importância de estudar e pesquisar sobre o destino. Além de otimizar o trabalho, o preparo pode evitar problemas. Entender sobre a cultura, a economia e, principalmente, sobre a política afetam o projeto e a viagem. Segundo Dias, quem deseja aderir deve começar o quanto antes com atividades voluntárias aqui mesmo, porque prepara e ajuda na hora da seleção.
Organizações também buscam reconhecimento internacional
Os responsáveis pelos projetos de voluntariado internacional enumeram os três principais objetivos das empresas com esse tipo de investimento: desenvolvimento dos profissionais, integração corporativa e reconhecimento institucional. De acordo com a diretora de cidadania da IBM Brasil, Alcely Barroso, um dos focos da companhia é desenvolver a visão global de seus funcionários, capacitando-os para exercer cargos de liderança. As viagens, acrescenta, também auxiliam as multinacionais no contato entre os colabores de diferentes países. “Para a empresa, ele (o funcionário) volta com uma dimensão e um conhecimento muito melhor da própria companhia”, afirma a diretora de ação social da Telefônica, Gabriella Bighetti. Entre as características também adquiridas durante experiência, as empresas destacam a capacidade criativa e de improvisação. Para os executivos, apesar de subjetivo, esse desenvolvimento dos profissionais é sentido no dia a dia do trabalho. “Ao saírem de sua zona de conforto, os profissionais voltam com mais autonomia e iniciativa”, afirma Alcely. As duas executivas afirmam que a adoção do voluntariado por parte da empresa é útil na retenção de talentos, pois favorece o “sentimento de pertencimento” à organização. O presidente da Fundação ArcelorMittal, Leonardo Gloor, destaca a referência institucional no mundo todo como um ganho diante dos investimentos no programa. “Mas, como em todo investimento social, o retorno para a marca é de longo prazo. Então, todo projeto precisa ser contínuo para surtir esse efeito”, ressalta o presidente do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), Cassio Mattos. Somando os números da IBM e da Telefônica, foram 40 funcionários brasileiros que participaram dos programas de voluntariado internacional em 2011. Agora em 2012, 12 voluntários já viajaram para o exterior pela ArcellorMittal Brasil.
Jovem diz que aprendeu a lidar com as diferenças
O acesso aos programas de voluntariado internacional não está restrito aos funcionários de grandes companhias. Muitos estudantes de graduação já perceberam que o trabalho voluntário pode fazer a diferença na hora de disputar uma vaga em empresas que valorizam esse tipo de atividade. Pensando nisso, o aluno de engenharia de gestão Thiago Fontanello participou do programa desenvolvido por uma ONG de estudantes e passou seis semanas dando aulas de inglês para crianças em Praga, na República Tcheca. “Eu vejo que as empresas se interessam cada vez mais por esse diferencial no currículo. Aprender a lidar com opiniões e comportamentos diferentes foi uma habilidade que aprendi durante a viagem e que hoje uso diariamente no meu estágio”, conta Fontanello. Para o diretor nacional de intercâmbios sociais da Aiesec, Matheus Koerich, a experiência também é fundamental para o amadurecimento pessoal e profissional do jovem, além de complementar a formação acadêmica. A Aiesec é uma organização mundial de estudantes dedicada a fornecer uma plataforma para desenvolvimento de jovens líderes e que inclui programas de voluntariado. Koerich conta que já fez o programa duas vezes, também na República Tcheca e na Sérvia. Sobre a possibilidade de fazer a viagem novamente, mas por uma empresa, Fontanello e Koerich afirmam: fariam sem dúvida nenhuma.
 
http://blogs.estadao.com.br/radar-do-emprego/os-ganhos-que-traz-o-trabalho-voluntario/

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