DECISÕES EM TEMPOS DE INCERTEZA

Otávio Augusto Moreira D`Elia

..As organizações sociais contemporâneas estão sendo palco de drásticas modificações nas exigências e expectativas em relação aos indivíduos. As modalidades de trabalho sofreram intensa transformação: os horários fixos e as jornadas rigidamente delimitadas no tempo e no espaço vêm sendo abandonados ao longo dos últimos anos, sendo substituídos por práticas laborais novas que enfatizam contratos de curto prazo na confecção de projetos e dotados de extensa flexibilidade.
O espaço físico das empresas se expandiu muito além da sua materialidade: os funcionários podem agora ser continuamente monitorados através da telefonia móvel e dos computadores portáteis em qualquer parte do planeta, o que torna tênue a fronteira entre o local do trabalho e o local do lazer, entre o tempo do trabalho e o tempo do lazer. Há alguns anos atrás tinha-se bem claro qual era o espaço do lar e qual o espaço do trabalho: as tecnologias atuais, contudo, parecem contribuir para confundir esses territórios.
Por outro lado, as informações se multiplicam com uma velocidade jamais vista e os indivíduos contam com cada vez menos tempo para tomada de decisão. Segundo reportagem da revista VEJA (edição 1.836, ano 37, n. 2, 14 de janeiro de 2004), um estudo realizado por psicólogos americanos com gerentes empregados em grandes companhias, descobriram que eles chegam a tomar uma decisão a cada nove minutos. São mais de 10.000 decisões por ano, o que significa 10.000 possibilidades de acerta ou errar. A idéia de flexibilidade nas carreiras e no comportamento, bem como a noção de ruptura com os modos tradicionais de trabalho estão presentes na descrição de vários autores contemporâneos. SENNET, por exemplo, a descreve dessa forma:
A expressão “capitalismo flexível” descreve hoje um sistema que é mais do que uma simples variação sobre um velho tema. Enfatiza-se a flexibilidade. Atacam-se as formas rígidas de burocracia, e também os males da rotina cega. Pede-se aos trabalhadores que sejam ágeis, estejam abertos a mudanças a curto prazo, assumam riscos continuamente, dependam cada vez menos de leis e procedimentos formais. (1999: 9)
Desse modo, o mundo atual do trabalho pede uma dedicação tão intensa porque os critérios de sucesso perderam seu contorno de estabilidade e nunca podemos dizer se permaneceremos em mobilidade ascendente. O fato de não alcançar a fama e a notabilidade são quase sempre interpretados como sinais de fracasso e de inabilidade pessoal. Assim, a flexibilidade exigida das pessoas rompe com os modelos tradicionais de conduta, podendo mergulhar os indivíduos na perplexidade e na confusão, absolutamente dependentes de receitas que indiquem caminhos serem seguidos.
 
Segundo TONELLI,
“As respostas das pessoas têm sido as mais contraditórias: retomada de caminhos religiosos, abuso do álcool e das drogas, adicção ao trabalho, adicção ao amor, adicção ao sexo, esportes radicais etc. (2001: 258)” 
Desse modo, na tentativa de adaptação aos padrões de performance para o mercado de trabalho, as pessoas se submetem sem questionar aos modelos, ansiando por fórmulas e técnicas que aliviem a angústia e indiquem o caminho do êxito. As mídias operam em larga escala fornecendo modelos de desempenho no trabalho da mesma maneira que procede que outras instâncias de nossas vidas, como o amor e o sexo, induzindo a todos a um movimento incessante, na busca de uma representação de sucesso que muitas vezes se revela inatingível, deixando a sensação de perda e falta.
Portanto, diante de uma avalanche de informações, muitas vezes o sujeito se sente incapaz de decidir, de escolher a melhor estratégia para lidar com sua carreira formulando autênticas questões hamletianas: Devo me impor mais na empresa ou já está na hora de sair? Devo abrir um negócio ou permanecer no meu cargo? Devo aceitar mais um sócio no meu escritório ou não é hora de ampliar? Devo investir meus ganhos num MBA ou no meu pequeno negócio? Muitas vezes, são dúvidas que podem por em sério risco a estabilidade financeira e exigem uma reflexão profunda para serem sanadas.
Embora não haja respostas mágicas, algumas atitudes podem e devem ser adotadas.Estar em constante processo de auto-conhecimento; sintonizar-se com as novidades e as informações; ser curioso e investigativo; não aceitar respostas prontas; ouvir pessoas com experiência; conhecer suas limitações e potencialidades; atualizar-se sempre no seu ramo de atividade são algumas das atitudes que aumentam significativamente seu potencial de seleção e escolha. Fuja das respostas prontas e das soluções mágicas: as conquistas exigem uma grande dose de esforço pessoal, de dedicação e de paixão. O fato de vivermos um tempo de incertezas torna tentadora as ofertas mirabolantes de solução que, paradoxalmente, ao invés de nos mostrar o caminho, nos afastam mais e mais de nossos verdadeiros desejos e de quem realmente somos. É improvável que uma outra pessoa possa nos dizer o que fazer de nossas vidas: essa decisão cabe exclusivamente a nós. Claro, podemos buscar auxílio, conselhos, sugestões, mas a decisão final será sempre nossa. Como disse uma vez o filósofo francês Jean-Paul Sartre, o homem será antes de mais nada, aquilo que tiver projetado ser.
SENNETT, R. A CORROSÃO DO CARÁTER. São Paulo: Record, 1999.
TONELLI, Maria José. ORGANIZAÇÃO, RELAÇÕES FAMILIARES E AMOROSAS, “in” GESTÃO COM PESSOAS E SUBJETIVIDADE (DAVEL, Eduardo e VERGARA, Sylvia Constant, org.) São Paulo, Editora Atlas, 2001,
Otávio Augusto Moreira D`Elia
(psicólogo, mestre em Comunicação – ECA-USP,
Psicoterapeuta com foco
em orientação profissional – CRP 06/44591-1)
email: oadelia@terra.com.br

Deixe um comentário